Critérios determinativos de distribuição de competência
Direitos e Deveres

Critérios determinativos de distribuição de competência


       A competência é distribuída de acordo com vários critérios. A doutrina procurou sistematizá-los, dividindo-os em três espécies: o critério objetivo, o critério funcional e critério territorial.
       Em toda causa os três critérios devem ser observados. Por exemplo: em uma ação de alimentos propostas em Salvador, observa-se o critério territorial (Salvador), o objetivo (Vara de Família) e o funcional (competência originária do juízo monocrático de primeira instância). Há situações em que um dos critérios é irrelevante, como, por exemplo, o exame da competência territorial de um tribunal superior, que exerce jurisdição em todo o território nacional.
       A sistematização é útil do ponto de vista prático, pois auxilia na identificação do juízo competente, e importante, do ponto de vista técnico, pois é a base de que se vale a legislação brasileira para criar as regras de competência absoluta ou relativa.
       i)                    Critério objetivo: em razão da matéria, em razão da pessoa e em razão do valor da causa
       O critério objetivo é aquele pelo qual se leva em consideração a demanda apresentada ao Poder Judiciário como o dado relevante para a distribuição da competência.
       É fundamental o conhecimento dos elementos da demanda para a correta compreensão deste critério: partes, pedido e causa de pedir. Com base nos elementos da demanda, distribui-se a competência. Assim, é possível identificar três sub-critérios oobjetivos de distribuição da competência.
       A)    Competência em razão da pessoa: a fixação da competência tendo em conta as partes envolvidas (rationae personae). O principal exemplo de competência em razão da pessoa é o da vara privativa da Fazenda Pública, criada para processar e julgar causas que envolvam entes públicos. Há casos de competência de tribunal determinada em razão da pessoa, como prerrogativa do exercício de algumas funções (mandado de segurança contra ato do Presidente da República é da competência do STF).
       B)    Competência em razão da matéria: a competência em razão da matéria é determinada pela natureza da relação jurídica controvertida, definida pelo fato jurídico que lhe dá causa. Assim, é a causa de pedir, que contém a afirmação do direito discutido, o dado a ser levado em consideração para a identificação do juízo competente. É com base neste critério que as varas de família, civil, penal, etc. são criadas. OBS: As competências material e pessoal são exemplos de competência absoluta.
       C)    Competência em razão do valor da causa: há regras de competência que são criadas a partir do valor da causa. O valor da causa é definido a partir do valor do pedido, um dos elementos da demanda. Um bom exemplo de competência em razão do valor da causa é a competência dos Juizados Especiais. OBS: O art. 111 do CPC permite a modificação da competência em razão do valor da causa. Seria, portanto, um exemplo de competência relativa. É por isso que o sujeito pode optar por demandar ou não perante o Juizado Especial Cível, no caso de uma demanda cujo valor é inferior ao teto dos Juizados Especiais.
       No entanto, a questão não é tão simples.
       A competência dos Juizados Especiais Federais, onde houver, é absoluta. O mesmo ocorre com os Juizados Especiais Estaduais da Fazenda Pública. Cria-se, pois, uma regra de competência em razão do valor da causa que é absoluta.
       Do mesmo modo, quando há competência em razão do valor da causa, o juízo é absolutamente incompetente para conhecer as causas que extrapolem o limite estabelecido. Assim, por exemplo, se o juízo somente tiver competência para julgar causas até cem salários-mínimos, se ele conhece e julga cujo valor é cento e dez salários-mínimos, há incompetência absoluta. Perceba, portanto, que, abaixo do limite imposto pela lei, está-se diante de uma competência relativa; acima do limite, de competência absoluta.
       ii)                  Critério territorial
       Os órgãos jurisdicionais exercem jurisdição nos limites das suas circunscrições territoriais. A competência territorial é a regra que determina em que território a causa deve ser processada. É o critério que distribui a competência em razão do lugar. Trata-se de competência, em regra, relativa, derrogável pela vontade das partes. As regras de competência territorial serão examinadas adiante, em item específico.
       iii)                Critério funcional
       A competência funcional – ou critério funcional de determinação da competência – relaciona-se com a distribuição das funções que devem ser exercidas em um mesmo processo. Toma-se por critério de distribuição aspectos endoprocessuais (internos), relacionados ao exercício das diversas atribuições que são exigidas do magistrado durante toda a marcha processual.
       Vicente Greco Filho sistematizou muito bem a competência funcional, que pode ser: a) por graus de jurisdição (originária ou recursal); b) por fases do processo (cognição e execução, p. ex.); c) por objeto do juízo: uniformização de jurisprudência, declaração de inconstitucionalidade em tribunal, etc. A distribuição da competência funcional pode ser visualizada em uma perspectiva em uma perspectiva horizontal (na mesma instância, como ocorre no caso de reconhecimento de inconstitucionalidade em tribunal) ou em uma perspectiva vertical (em instâncias diversas, como ocorre com a divisão da competência originária e da competência derivada).
       Belo exemplo para visualizar a competência funcional (no caso, por objeto do juízo) é o do processo de apuração dos crimes dolosos contra a vida: a) ao juiz singular compete pronunciar ou impronunciar o réu, absolve-lo sumariamente ou desqualificar o crime; b) uma vez pronunciado o réu, cabe ao Conselho de Sentença condenar ou absolve-lo; c) uma vez condenado, voltam os autos ao Juiz Presidente, para que proceda à dosimetria da pena.
       Competência funcional x Competência territorial absoluta
       O legislador e parte da doutrina nacional adotam, em alguns momentos, a concepção chiovendiana, segundo a qual também se visualiza a competência funcional quando uma causa é confiada ao juiz de determinado território, pelo fato de ser a ele mais fácil ou mais eficaz exercer a sua função. Cria-se, então, uma competência territorial funcional (art. 95 do CPC; art. 2º da Lei Federal n. 7.347/85, etc.).
       A justificação apresentada para a criação dessa categoria especial (híbrida) de critério de distribuição de competência prova demais: existe regra de competência criada com a consciência de que o magistrado não exercerá da melhor maneira possível as suas funções? Por acaso podemos dizer que, quando se estabelece o foro do domicílio do réu como o genericamente competente (art. 94 do CPC), não objetivava o legislador que neste foro pudesse o magistrado exercer melhor as suas funções?
       Consideramos ser caso de competência territorial absoluta (excepcional, é verdade, à luz do art. 111 do CPC), semelhante ao regime do foro da situação da coisa, para as ações reais imobiliárias previstas na parte final do art. 95 do CPC. A doutrina mais recente já se vem apercebendo disso, qualificando a competência da ação civil pública como territorial absoluta. Recentemente, também dessa forma, o art. 80 da Lei Federal 10.741, o Estatuto do Idoso: “As ações previstas neste Capítulo serão propostas no foro do domicílio do idoso, cujo juízo terá competência absoluta para processar a causa, ressalvadas as competências da Justiça Federal e a competência originária dos Tribunais Superiores”.
       A competência funcional pela vinculação do juiz ao processo – o princípio da identidade física do juiz (art. 132, CPC)
       O art. 132 do CPC estabelece o chamado princípio da identidade física do juiz, segundo o qual o juiz da sentença deve ser o mesmo que ultimou audiência de instrução e julgamento. Trata-se de regra que deriva do princípio da oralidade, segundo o qual as provas devem ser produzidas perante o magistrado que julgará a causa.
       O CPC adotou uma solução prática: manteve o princípio da identidade física do juiz, que vinha desde o CPC-39 (art. 120) como regra geral e impositiva, excetuando-se aquelas hipóteses em que a experiência o desaconselhou.
       A Lei Federal n. 8.637/93 reescreveu o art. 132 do CPC, com o objetivo de manter o princípio da identidade física, desde que restrito ao magistrado que concluir a audiência. Impõe, com isso, hipótese de competência funcional e, pois, absoluta. Eis a redação do dispositivo: “Art. 132. O juiz titular ou substituto, que concluir a audiência julgará a lide, salvo se estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado, casos em que passará os autos ao seu sucessor. Parágrafo único. Em qualquer hipótese, o juiz que proferir a sentença, se entender necessário, poderá mandar repetir provas já produzidas.”
       A vinculação do juiz ao processo, assim, exige o preenchimento de alguns requisitos: a) o juiz ter concluído a audiência de instrução e julgamento (não basta ter concluído a audiência de conciliação); b) ter havido colheita de prova oral; c) não estiver o juiz, por qualquer motivo, afastado ou impedido.
       O desrespeito à regra implica invalidade, pois fere norma que impõe regra cogente de competência. É hipótese, inclusive, que autoriza ajuizamento de ação rescisória (art. 485, II, CPC).
       A regra, no entanto, é de difícil aplicação prática e tem causado certos transtornos.
       O legislador, ciente desta circunstância, retirou a exigência em hipóteses de afastamento do magistrado, que, mesmo que tenha terminado a audiência, não fica mais vinculado ao processo.
       Em razão do acúmulo de serviço, surgiu, na vida forense, a figura do juiz cooperador ou auxiliar, que exercerá a jurisdição em determinado juízo conjuntamente com o respectivo magistrado titular. Não podem ser redistribuídos ao juiz auxiliar, todavia, aqueles processos conclusos para sentença nos quais o juiz titular tenha concluído o recebimento da prova oral.
       O magistrado que, não tendo colhido a prova, receber a causa, poderá mandar repetir as provas já produzidas, acaso assim entenda necessário.



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