Compete à Justiça comum estadual o processo e julgamento do delito de interceptação telefônica sem autorização judicial (art. 10 da Lei n. 9.296/1996), pois não se evidencia ofensa a bens, serviços ou interesses da União, suas autarquias ou empresas públicas, mas sim violação da privacidade do particular. Precedente citado: CC 40.113-SP, DJ 1º/7/2004. CC 98.890-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 11/2/2009.
Segundo o disposto no artigo 10 da Lei 9.296/96 "Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei".
A interceptação telefônica é exceção no ordenamento jurídico brasileiro, e somente será realizada para fins de investigação criminal e instrução processual penal. Assim, a regra é a inviolabilidade do sigilo, o qual consiste em direito fundamental assegurado expressamente pela Carta Magna, conforme artigo a seguir:
Art. 5º (...)
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; (grifos nossos)
Note-se que, em razão dos direitos fundamentais não possuírem caráter absoluto, podem sofrer limitações. Contudo, as limitações devem atender a determinados requisitos legais para que seja considerada valida, e no caso da interceptação telefônica os requisitos são:
a) para fins de investigação criminal ou instrução processual penal (art. 5º, XII, parte final da CR/88);
b) indícios razoáveis de autoria ou participação em infração penal, consagrando a necessidade do "fumus boni iuris" (artigo 2º, II Lei 9.296/96);
c) a interceptação deve ser o único meio de prova disponível (artigo 2º, III Lei 9.296/96);
d) o fato a ser investigado deve ser punido com reclusão - a doutrina é unânime em criticar esse inciso (artigo 2º, III Lei 9.296/96);
e) determinada por autorização judicial (artigo 3º, Lei 9.296/96).
E ainda, o parágrafo único do artigo 2º, da aludida Lei 9.296/96 exige que "em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada".
Portanto, na ausência desses requisitos, a interceptação poderá ter sua legalidade questionada, o que será processado perante a Justiça Estadual, tendo em vista que o bem jurídico violado é a privacidade do particular.
Ressalte-se que, não é caso de competência da Justiça Federal, pois está será fixada quando presente algumas das hipóteses previstas nos incisos do artigo 109 da CR/88, in verbis:
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada ou residente no País;
II - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo internacional;
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
V - A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema financeiro e a ordem econômico-financeira;
VII - os "habeas-corpus", em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;
VIII - os mandados de segurança e os "habeas-data" contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;
IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;
X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade, inclusive a respectiva opção, e à naturalização;
XI - a disputa sobre direitos indígenas.
Diante da regra constitucional supra e da ausência de ofensa a bens, serviços ou interesses da União a Corte Superior atribuiu competência à Justiça Estadual para processar e julgar crime de interceptação telefônica sem a devida autorização judicial.
Fonte: Informativo 383