No dia 20 de junho do corrente ano, fora publicada no Diário Oficial da União a Lei 11.706/08, que alterou, substancialmente, o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03).
Vejamos as alterações.
O primeiro alvo foi o artigo 4º, que cuida dos requisitos para a aquisição de arma de fogo de uso permitido. O ponto alterado foi o inciso I, que, na redação antiga estabelecia que "para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal".
Em consonância com a nova redação, aludido dispositivo passou a prever como requisito a "comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos".
O § 2º do mesmo dispositivo também foi atingido pela nova legislação. Uma alteração bastante sutil para os desatentos, mas, que altera substancialmente o conteúdo da norma.
Na redação antiga a norma previa que "a aquisição de munição somente poderá ser feita no calibre correspondente à arma adquirida e na quantidade estabelecida no regulamento desta Lei".
Com a Lei em análise, a norma passou a vigorar com a seguinte redação: "a aquisição de munição somente poderá ser feita no calibre correspondente à arma registrada e na quantidade estabelecida no regulamento desta Lei".
Na seqüência, fora introduzido um novo parágrafo ao artigo 4º. Falamos do § 8º, segundo o qual: "estará dispensado das exigências constantes do inciso III do caput deste artigo, na forma do regulamento, o interessado em adquirir arma de fogo de uso permitido que comprove estar autorizado a portar arma com as mesmas características daquela a ser adquirida".
O inciso III da norma supracitada estabelece como requisito para a aquisição de arma de fogo, de uso permitido "a comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento da Lei".
O artigo 5º, que cuida do alcance do certificado do Registro de Arma de Fogo também mudou. Até então, com esse certificado, o proprietário da arma poderia mantê-la apenas no interior de sua residência ou domicílio. Com a vigência da Lei 11.706/08, ampliou-se essa permissão, autorizando que o proprietário mantenha a arma também em seu local de trabalho, desde que comprove que é o titular ou o responsável pelo estabelecimento ("o certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa").
Por conseguinte, a alteração em relação à renovação dos registros expedidos antes da publicação da nova Lei. De acordo com o antigo § 3º (com redação alterada pela MP 417/08) "os registros de propriedade expedidos pelos órgãos estaduais, realizados até a data da publicação desta Lei, deverão ser renovados mediante o pertinente registro federal até 31 de dezembro de 2008".
Com a nova redação, tal dispositivo estabelece que "o proprietário de arma de fogo com certificados de registro de propriedade expedido por órgão estadual ou do Distrito Federal até a data da publicação desta Lei que não optar pela entrega espontânea prevista no art. 32 desta Lei deverá renová-lo mediante o pertinente registro federal, até o dia 31 de dezembro de 2008, ante a apresentação de documento de identificação pessoal e comprovante de residência fixa, ficando dispensado do pagamento de taxas e do cumprimento das demais exigências constantes dos incisos I a III do caput do art. 4o desta Lei".
Do que se vê, o prazo para a renovação do registro permaneceu o mesmo: 31 de dezembro deste ano (2008). O que se alterou foi, de maneira geral, o procedimento adotado. A norma revogada falava apenas nos registros concedidos por órgãos estaduais. Corrigindo a omissão, a nova Lei abrangeu aqueles outorgados por órgão do DF. Os requisitos exigidos para a renovação foram ampliados. Além de providenciar o registro em âmbito federal, o interessado deverá comprovar a sua identificação pessoal, e, residência fixa.
No que se refere às exceções previstas no artigo 6º, destacam-se as seguintes alterações. O § 1º que dispunha "as pessoas previstas nos incisos I, II, III, V e VI deste artigo terão direito de portar arma de fogo fornecida pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, na forma do regulamento, aplicando-se nos casos de armas de fogo de propriedade particular os dispositivos do regulamento desta Lei", passou a vigorar com a seguinte redação, in verbis:
§1º As pessoas previstas nos incisos I, II, III, V e VI do caput deste artigo terão direito de portar arma de fogo de propriedade particular ou fornecida pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, nos termos do regulamento desta Lei, com validade em âmbito nacional para aquelas constantes dos incisos I, II, V e VI.
Nessa mesma linha, as alterações do § 3º, no qual o legislador alterou apenas a parte final "a autorização para o porte de arma de fogo das guardas municipais está condicionada à formação funcional de seus integrantes em estabelecimentos de ensino de atividade policial, à existência de mecanismos de fiscalização e de controle interno, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei, observada a supervisão do Ministério da Justiça".
Antes, a supervisão ficava a cargo do Comando do Exército.
O §5º da norma em comento, que trata da autorização para os residentes em área rural, também foi alvo de modificação.
Analisemos a redação antiga: "aos residentes em áreas rurais, que comprovem depender do emprego de arma de fogo para prover sua subsistência alimentar familiar, será autorizado, na forma prevista no regulamento desta Lei, o porte de arma de fogo na categoria "caçador"".
Hoje, com a Lei 11.706/08 a norma passou a vigorar com a seguinte redação, in verbis:
§ 5o Aos residentes em áreas rurais, maiores de 25 (vinte e cinco) anos que comprovem depender do emprego de arma de fogo para prover sua subsistência alimentar familiar será concedido pela Polícia Federal o porte de arma de fogo, na categoria caçador para subsistência, de uma arma de uso permitido, de tiro simples, com 1 (um) ou 2 (dois) canos, de alma lisa e de calibre igual ou inferior a 16 (dezesseis), desde que o interessado comprove a efetiva necessidade em requerimento ao qual deverão ser anexados os seguintes documentos:
I - documento de identificação pessoal;
II - comprovante de residência em área rural; e
III - atestado de bons antecedentes
Em consonância com a redação antiga, bastava que o interessado comprovasse que a arma era indispensável para a subsistência da família, e, o porte autorizado era na espécie de caçador. Com as alterações, a autorização somente será concedida a maiores de 25 anos, pela Polícia Federal, na categoria caçador para subsistência. Ademais, apenas será outorgada autorização para o porte de UMA arma de fogo, nos moldes então estabelecidos.
Incluiu-se o § 7º: "aos integrantes das guardas municipais dos Municípios que integram regiões metropolitanas será autorizado porte de arma de fogo, quando em serviço".
O artigo 11, que cuida da cobrança de taxas para o registro, a sua renovação, expedição de segunda via, renovação do porte, em seu § 2º (das isenções) passou a dispor que "são isentas do pagamento das taxas previstas neste artigo as pessoas e as instituições a que se referem os incisos I a VII e X e o § 5o do art. 6o desta Lei".
Nessa linha de raciocínio, verifica-se que não estão sujeitos ao pagamento de qualquer dessas taxas:
a) os integrantes das forças armadas, os integrantes de órgãos previstos no artigo 144 da CF (polícia federal; polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal; polícias civis, e polícias militares e corpos de bombeiros militares),
b) os integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 e menos de 500.000 habitantes, quando em serviço,
c) os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os Agentes do Departamento de segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República
d) os integrantes dos órgãos referidos no artigo 51, IV e artigo 52, XII da CF
e) os integrantes do quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais, os integrantes de escoltas de presos e escoltas portuárias,
f) os integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, nos cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário
g) os residentes em áreas rurais (caçadores de subsistência)
Conferiu-se, igualmente, nova redação ao artigo 23 "a classificação legal, técnica e geral bem como a definição das armas de fogo e demais produtos controlados, de usos proibidos, restritos, permitidos ou obsoletos e de valor histórico serão disciplinadas em ato do chefe do Poder Executivo Federal, mediante proposta do Comando do Exército".
O artigo 25, que cuida do destino da arma apreendida ("armas de fogo, acessórios ou munições apreendidos serão, após elaboração do laudo pericial e sua juntada aos autos, encaminhados pelo juiz competente, quando não mais interessarem à persecução penal, ao Comando do Exército, para destruição, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas"), passou a vigorar com a seguinte redação, in verbis
Art. 25 As armas de fogo apreendidas, após a elaboração do laudo pericial e sua juntada aos autos, quando não mais interessarem à persecução penal serão encaminhadas pelo juiz competente ao Comando do Exército, no prazo máximo de 48 (quarenta e oito) horas, para destruição ou doação aos órgãos de segurança pública ou às Forças Armadas, na forma do regulamento desta Lei.
Nessa mesma linha, a alteração do artigo 30, que dispunha: "os possuidores e proprietários de armas de fogo de fabricação nacional, de uso permitido e não registradas, deverão solicitar o seu registro até o dia 31 de dezembro de 2008, apresentando nota fiscal de compra ou comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova em direito admitidos, ou declaração firmada na qual constem as características da arma e a sua condição de proprietário".
Vejamos a redação atual: "Os possuidores e proprietários de arma de fogo de uso permitido ainda não registrada deverão solicitar seu registro até o dia 31 de dezembro de 2008, mediante apresentação de documento de identificação pessoal e comprovante de residência fixa, acompanhados de nota fiscal de compra ou comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova admitidos em direito, ou declaração firmada na qual constem as características da arma e a sua condição de proprietário, ficando este dispensado do pagamento de taxas e do cumprimento das demais exigências constantes dos incisos I a III do caput do art. 4o desta Lei".
Por derradeiro, um dos dispositivos considerados mais importantes do Estatuto: o artigo 32, que, segundo a doutrina, traz em seu bojo hipótese de anistia, ou, descriminalização temporária aos possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas.
Em sua redação vigente até a Lei em análise, a norma supracitada estabelecia que "os possuidores e proprietários de armas de fogo poderão entregá-las, espontaneamente, mediante recibo e, presumindo-se de boa fé, poderão ser indenizados". (Redação dada pela Medida Provisória nº 417, de 2008).
Hoje, o dispositivo determina que "os possuidores e proprietários de arma de fogo poderão entregá-la, espontaneamente, mediante recibo, e, presumindo-se de boa-fé, serão indenizados, na forma do regulamento, ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da referida arma".
Para que melhor se compreenda esse tópico tão importante, cumpre-nos analisar a redação original desse artigo: "os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas poderão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, entregá-las à Polícia Federal, mediante recibo e, presumindo-se a boa-fé, poderão ser indenizados, nos termos do regulamento desta Lei".
Foi nesse contexto que a doutrina firmou-se no sentido de a norma ter contemplado a chamada abolitio criminis temporária, haja vista que, nesse prazo de 180 dias, não haveria como imputar a alguém os crimes previstos nos artigos 12 e 16, que cuidam, respectivamente, da posse irregular de arma de fogo de uso permitido, e, da posse irregular de arma de fogo de uso restrito.
Do que se vê, a redação hoje consagrada prevê, expressamente, a extinção da punibilidade da posse ilegal da arma, quando da sua entrega espontânea ao órgão competente. Trata-se, assim, de reconhecimento legal, e, não mais doutrinário, da causa extintiva de punibilidade, pela anistia.