O provimento de cargos comissionados do serviço público por meio da contratação de parentes (nepotismo) é praga que viceja no Brasil desde a colônia. A forma original de dizimá-la há muito distanciou-se no tempo com a resistência ao ingresso do Estado na era do administrador profissional. Vale dizer, mediante identificação permanente das funções do aparelho governamental e convocação de quadros hábeis a executá-las. Um processo que, convém explicar, compreende preencher os cargos pelo critério único da seleção meritocrática (concurso público) e aperfeiçoamento constante das habilidades de cada servidor.
À falta de semelhante reforma, vez em quando surgem tentativas de pôr fim à anomalia, algumas apenas para amortecer a indignação da sociedade. Nada para operar efeito no mundo real. Mas, em agosto do ano passado, ante avassalador uso da máquina estatal como cabide de emprego para familiares, o Supremo Tribunal Federal (STF) entrou em cena para reprimir o abuso. A súmula vinculante que, então, editou, proibiu o nepotismo no âmbito dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
O texto vedou a nomeação de cônjuge, companheiro(a), parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau para cargo em comissão ou de confiança na administração pública direta e indireta. Alcançou, também, o nepotismo cruzado (quando autoridades contratam parentes de outras autoridades para driblar a relação direta de parentesco). Mas não chegou a excepcionar alguns casos, como o de servidor há muito em atividade que se casa com companheira de trabalho lotada na mesma repartição.
Agora, a Controladoria-Geral da União (CGU) sistematizou ação com regras dotadas de eficácia plena para encerrar as práticas nepóticas na esfera do Executivo federal. Muniu-se o órgão de decreto para obter informações dos ministérios a fim de relacionar os contratados com base em parentesco. O órgão tem em mãos, por enquanto, 73% dos dados requeridos. Quando forem completados, deverão abranger os 21.699 funcionários comissionados. Mas, já partir do percentual conseguido, a CGU promoverá a identificação dos casos que devem ensejar a expedição dos atos de demissão. A iniciativa será seguida de decreto presidencial em que, também, haverá definição das formas de nepotismo e das lacunas deixadas pela súmula do STF.
O primeiro passo do trabalho consistirá em verificar a existência de subordinação direta entre parentes. Trata-se de hipótese proibida pelo Regime Jurídico Único dos Servidores Civis da União (Lei nº 8.112/1990). A vinculação será banida e punida a irregularidade. Entenda-se que o saneamento da administração pela extinção de privilégio incompatível com a moralidade pública não atende apenas a exigências de natureza ética. Impõe-se, sobretudo, para afastar grave ofensa aos princípios do mérito, da transparência e da legalidade consagrados na Constituição. |