Contrato de mãe para filha na Integração
Direitos e Deveres

Contrato de mãe para filha na Integração



Autor(es): Alana Rizzo
Correio Braziliense - 08/11/2010


Enquanto uma é coordenadora-geral de Recursos Humanos, a outra trabalha na Secretaria Executiva. Ministério nega nepotismo

A coordenadora-geral de Recursos Humanos do Ministério da Integração Nacional, Maria Macicler Moreira, contratou a filha para trabalhar no órgão. Daniele Moreira é coordenadora-geral do Departamento de Gestão dos Fundos de Investimentos da Secretaria Executiva da pasta. A nomeação, assinada pelo ministro, João Reis Santana (PMDB-BA), foi publicada no Diário Oficial da União em 27 de setembro deste ano. As duas ocupam o mesmo cargo de direção, com salário de R$ 6.843,76. O ministério, entretanto, nega nepotismo.

Dois dias após a publicação do ato ? em 29 de setembro ?, Pedro Augusto Sanguinetti Ferreira, secretário executivo substituto do ministério, encaminhou ofício para a CGU comunicando a contratação de Daniele. No documento, Ferreira afirma que a nomeação está respaldada pelo Decreto nº 7.203/10. E apresenta duas justificativas: ?Não tratar-se de cargo em comissão de menor grau hierárquico? e ? de que não há subordinação direta?. O secretário, atual chefe de gabinete do ministro, alega ainda que a filha de Maria Macicler desempenhava atividades no setor desde 2004 e que o critério da nomeação foi técnico. ?O servidor nomeado tem nível superior, na qualidade de bacharel de direito, e vasta experiência nos assuntos daquela competência?, diz o texto.

Ferreira não diz que Daniele começou a prestar serviços para o ministério dois anos antes. Ela foi contratada pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura para apoiar um projeto de cooperação técnica da pasta com a organização não governamental internacional. O acordo duraria até 15 de janeiro de 2004. O salário era de R$ 1.828 mensais. Nos anos seguintes a 2004, Daniele continuou atuando no ministério. A mãe já trabalhava na pasta. Em 1995, Maria Macicler foi aposentada, de acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), como assistente administrativa do órgão. Quatro anos depois, assumiu a coordenação de RH, segundo dados do Portal da Transparência.

A legislação que proíbe nepotismo na administração federal aponta como exceções casos em que as nomeações sejam de pessoas já em exercício no mesmo órgão antes do início do vínculo familiar com o agente público para cargo de nível hierárquico igual ou mais baixo que o anteriormente ocupado.

Procurada, a CGU informou que investigava a denúncia quando Daniele ainda era terceirizada. O ministério afirmou, então, ao órgão que tinha resolvido o impasse com a nomeação de Daniele. Agora, a CGU defende que o caso caracteriza-se como nepotismo. Em nota, o órgão de controle afirma que ?o ministério procurou justificar a nomeação perante a CGU, alegando não ter havido influência na nomeação, mas sim uma escolha baseada na experiência da pessoa naquele trabalho durante vários anos como terceirizada, e também que não se tratava de uma nomeação para cargo inferior, e sim de igual nível?.

Porém, para a CGU, ainda que se admita como verdadeira a primeira alegação, isso não afasta o enquadramento do caso como nepotismo, nos termos da legislação. E quanto à segunda justificativa, também não procede.

O Ministério da Integração Nacional informou que a nomeação não foi feita pela coordenadora de RH. ?Foi ato do ministro, por solicitação técnica do Diretor do DGFI/MI, baseado na presunção de legalidade do ato praticado, enquadrado nas exceções do art. 4º do Decreto nº 7.203/10.? Joaquim Batista de Araújo é o atual responsável pela Diretoria de Gestão dos Fundos de Investimento (DGFI).

O Correio tentou falar com Maria Macicler e Daniele. As duas nunca estavam disponíveis e também não retornaram as ligações. Em nota, o ministério alega ainda que comunicou a contratação em 3 de novembro à Procuradoria da República do Distrito Federal.

Proibição
O Conselho Nacional de Justiça e o Supremo Tribunal Federal elaboraram medidas proibindo o nepotismo nos Três Poderes da União, estados e municípios até o parentesco de terceiro grau. As resoluções também vedam o nepotismo cruzado, quando familiares de um agente público são empregados por outro como contrapartida. Na edição da súmula vinculante 13, o STF entendeu que a contratação de parentes desrespeita a Constituição. A legislação prevê que o serviço público deve zelar pela legalidade, moralidade, eficiência e impessoalidade.

?A sociedade espera que as pessoas sejam nomeadas para cargos de confiança pelo seu mérito e não pelo seu sobrenome ou grau de parentesco. Até porque se há tantas qualificações, ela pode ocupar cargo em outra área que não aquela em que já tem um parente?, explica o conselheiro do CNJ, Marcelo Nobre. Nos processos analisados pelo Supremo e o CNJ, segundo ele, o entendimento do nepotismo tem sido mantido, mesmo nos casos em que não há subordinação direta.

Estratégia
A pasta da Integração Nacional é comandada desde abril por João Santana, do PMDB. Ele assumiu depois que Geddel Vieira Lima deixou o cargo para disputar o governo da Bahia. Discípulo do ex-chefe, ele é responsável por áreas estratégicas do governo, como obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e a transposição do Rio São Francisco. Os dois fizeram questão de encaminhar parte significativa dos recursos da pasta para o estado natal. A pasta está na mira do PSB. Ciro Gomes (PSB-CE) já chefiou o Ministério no passado.





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