Direitos e Deveres
Consulados brasileiros se multiplicam, sem grande preocupação com as contas
Rosana Hessel
Correio Braziliense - 08/11/2010
Se os limites da emissão de bilhetes e de diárias para as viagens de servidores públicos ao exterior são frouxos no Brasil, os gastos das embaixadas e dos consulados lá fora aproximam-se de uma verdadeira caixa-preta. Apesar de o Tribunal de Contas da União (TCU) ter determinado há cinco anos que o Palácio do Itamaraty incluísse seus escritórios no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), programa que controla todos os gastos da União, praticamente nada ocorreu até hoje. Das 235 representações no exterior, apenas 16 prestam contas do dinheiro do contribuinte empregado em atividades diárias do corpo diplomático. O Siafi é utilizado para a prestação de contas dos órgãos do governo.Sua meta é dar mais transparência à forma como o dinheiro dos impostospagos pelos brasileiros é empregado. Nele, é possível identificar as despesas por órgão, por departamento, ou até mesmo por servidor público. Mas o Ministério das Relações Exteriores (MRE) informa que,apesar de esforços continuados, ?ainda enfrenta limitações técnicas? para integrar suas contas aos computadores do governo em Brasília.?As alegações dos motivos por que as embaixadas não estão no Siafi são as mais diferentes possíveis. Vão da falta de funcionários a falhas de comunicação. São as mesmas desculpas dadas há mais de 10 anos. Será que eles ainda não encontraram tempo para melhorar??, questiona o secretário-geral da organização não governamental Contas Abertas, Gil Castello Branco. São diversas as justificativas ? algumas delas beirando ao exagero da trivialidade ? encontradas para não prestar contas das despesas de seus diplomatas mundo afora. A primeira delas,segundo o Itamaraty, reside no fato de não haver agências do Banco do Brasil em todos os países em que há representações, além do fato de o BB não operar com suas respectivas moedas.
Fuso horário
Outro motivo alegado pelo Itamaraty é que a internet ainda é precária em vários pontos do planeta, um dos obstáculos ao acesso do sistema on-line administrado pelo Tesouro Nacional ? uma explicação pouco convicente, na opinião de Castello Branco. ?Dia desses, fiz um teste na África do Sul. Consegui acessar facilmente o Siafi. Não entendo a dificuldade deles (dos diplomatas)?, ironizou. No rol de explicações do ministério, há até problemas como o reduzido número de funcionários e o fuso horário divergente, já que o sistema brasileiro só funciona as 7h às 23h, no horário de Brasília, e os escritórios, muitas vezes,estão no outro lado do mundo, onde o dia é noite. Nesses casos, a prestação de contas só ocorre com atraso, defende-se o Itamaray.Pelas contas do governo, estão integradas ao sistema as embaixadas de Tóquio, Londres, Pretória, Madri, Santiago e Buenos Aires, além dos consulados-gerais em Nova York, Buenos Aires, Houston, São Francisco, hicago, Boston, Miami, Tóquio, São Francisco e Madri, e ainda o escritório financeiro em Nova York. Para 2011, serão integradas as embaixada em Haia, em Bruxelas e em Ottawa; as missões do Brasil na Comunidade Europeia, em Bruxelas; a delegação do Brasil na Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington; e os consulados-gerais em Atlanta, Los Angeles, Barcelona e em Roterdã.Nessa lista, ainda não está a Embaixada de Washington, a maior do país, e consequentemente, com maior despesa. Questionado pelo Correio, o Itamaraty disse que a inclusão da representação no Siafi ainda não ocorreu porque ela encontra-se em reforma. ?A embaixada está funcionando em salas alugadas desde 2008, e essa obra vinha sendo planejada desde 2004 e deve terminar em 2011.?
Discrepâncias
Enquanto o Palácio do Itamaraty arrasta-se para dar transparência aos gastos em seus escritórios no exterior, as poucas despesas que aparecem no sistema de controle exibem enorme discrepância em torno de itens semelhantes. A gastança com produtos de higiene e limpeza em Santiago do Chile, por exemplo, chega ser 455 vezes superior ao dinheiro desembolsado para a mesma finalidade no Consulado de Houston, nos Estados Unidos, ou ainda 14,7 vezes acima do consumo da Embaixada em Pretória, na África do Sul. Os gastos com manutenção de veículos equivalem, em alguns casos, o de um carro zero quilômetro. No caso de material de limpeza, a distância entre gastos chega a ser monstruosa. Entre janeiro e 21 de outubro deste ano, o item consumiu R$ 5,3 mil da Embaixada em Tóquio, mas foi bem maior nos escritórios e Londres (R$ 14,3 mil) e Santiago (R$ 31,3 mil), por exemplo. A dispersão de valores é investigada se houver alguma denúncia, já que o controle cabe ao Palácio do Itamaraty. As planilhas de gastos de cada escritório no exterior é verificada apenas a cada seis meses por um órgão interno do próprio ministério. O fato de estarem em outro país parece dar aos servidores de embaixadas e dos consulados a liberdade ue seus colegas brasileiros não têm para gastar.
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