Roubo: Emprego de Arma de Fogo e Causa de Aumento
A Turma decidiu afetar ao Plenário julgamento de habeas corpus em que se discute se, para a caracterização da majorante prevista no art. 157, § 2º, I, do CP, é dispensável ou não a perícia da arma de fogo. Trata-se, na espécie, de writ em que a Defensoria Pública da União sustenta constrangimento ilegal consistente na incidência dessa causa de aumento, sem que verificado o potencial lesivo do revólver, à pena aplicada a condenado por roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo e pelo concurso de pessoas. Deliberou-se, também, sobrestar todos os processos que tramitam pela Turma em igual situação. HC 96099/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 3.2.2009. (HC-96099).
A Primeira Turma decidiu afetar ao Plenário do STF o julgamento do HC 96099 em que se discute sobre a dispensabilidade ou não da perícia na arma de fogo utilizada em roubo para efeitos de incidência de aumento de pena, nos termos do art. 157, § 2º, I, do CP.
A matéria é extremamente polêmica, mas o STJ tem decidido reiteradamente pela desnecessidade de apreensão e perícia da arma de fogo, mormente quando a prova testemunhal é firme sobre sua utilização na prática da conduta criminosa.
HC 112506 / DF. EMENTA: HABEAS CORPUS. ROUBO DUPLAMENTE CIRCUNSTANCIADO PELO EMPREGO DE ARMA E CONCURSO DE PESSOAS. PENA DE 8 ANOS E 7 DIAS DE RECLUSÃO. UTILIZAÇÃO DE ARMA DE FOGO. AUSÊNCIA DE APREENSÃO E PERÍCIA DA ARMA. DESNECESSIDADE PARA A APLICAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. DOSIMETRIA DA PENA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA PARA A MAJORAÇÃO, EM 3/8, DA FRAÇÃO RELATIVA ÀS CAUSAS DE AUMENTO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, PARA QUE SEJA FIXADO NO MÍNIMO (1/3) A CAUSA DE AUMENTO.1. A apreensão e a perícia da arma de fogo utilizada no roubo são desnecessárias para configurar a causa especial de aumento de pena, mormente quando a prova testemunhal é firme sobre sua efetiva utilização na prática da conduta criminosa. 2. A regra é que uma arma possua potencial lesivo; o contrário, a exceção. Se assim alega o acusado, é dele o ônus dessa prova (art.156 do CPP). Se restou comprovada a utilização da arma de fogo, como no caso concreto, o ônus de demonstrar eventual ausência de potencial lesivo deve ficar a cargo da defesa, sendo inadmissível a transferência desse ônus à vítima ou à acusação, por uma questão de isonomia, porquanto inúmeros fatores podem tornar a prova impossível. (...)
HC 115534 / SP. EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO. CAUSA DE AUMENTO DE PENA REFERENTE AO USO DE ARMA DE FOGO. AUSÊNCIA DE APREENSÃO E DE PERÍCIA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA EFICÁCIA DA ARMA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. DECOTE DA CAUSA.CONCURSO DE AGENTES - UM MENOR E DOIS DESCONHECIDOS - ADMISSIBILIDADE. ATENUANTE LEVANDO A PENA ABAIXO DO MÍNIMO - IMPOSSIBILIDADE - REGIME MAIS GRAVOSO - CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EVIDENCIADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. A necessidade de apreensão da arma de fogo para a implementação da causa de aumento de pena do inciso I, do § 2.º, do art. 157, do Código Penal, tem a mesma raiz exegética presente na revogação da Súmula n. 174, deste Sodalício. 2. Sem a apreensão e perícia na arma, nos casos em que não é possível aferir a sua eficácia por outros meios de prova, não há como se apurar a sua lesividade e, portanto, o maior risco para o bem jurídico integridade física. (...)
HC 115450 / SP. EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO PELO CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APREENSÃO E PERÍCIA. PRESCINDIBILIDADE. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO. MAUS ANTECEDENTES. INQUÉRITOS E PROCESSOS EM CURSO. IMPOSSIBLIDADE. APELAÇÃO EXCLUSIVA DA DEFESA. VALORAÇÃO DESFAVORÁVEL DE OUTRAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS NÃO-CONSIDERADAS PELA SENTENÇA. IMPOSSIBILIDADE. REFORMATIO IN PEJUS. CONCURSO DE DUAS MAJORANTES. NÃO-DEMONSTRADAS CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS QUE INDIQUEM A NECESSIDADE DE EXASPERAÇÃO DA PENA ALÉM DA FRAÇÃO MÍNIMA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.1. A jurisprudência majoritária da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça é no sentido da prescindibilidade da apreensão e perícia da arma de fogo para a caracterização da causa de aumento de pena do crime de roubo (art. 157, § 2º, I, do Código Penal), quando outros elementos comprovem sua utilização. (...)
No STF também temos algumas decisões:
HC 94448 / RS .EMENTA: HABEAS CORPUS. RECONHECIMENTO DA REINCIDÊNCIA COMO AGRAVANTE. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NÃO CONHECIMENTO. CAUSA DE AUMENTO DE PENA PREVISTA NO ART. 157, § 2º, I, DO CÓDIGO PENAL. PRESCINDIBILIDADE DA REALIZAÇÃO DE PERÍCIA NA ARMA UTILIZADA NO ROUBO. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA PARTE, DENEGADA. O Superior Tribunal de Justiça sequer examinou o pedido da acusação para que a agravante da reincidência fosse reconhecida. Daí por que não há como o presente habeas corpus ser conhecido nesse ponto. O reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal prescinde da apreensão e da realização de perícia na arma utilizada no roubo. Precedentes (HC 84.032, rel. min. Ellen Gracie, DJ de 30.04.2004, p. 70; e HC 92.871, rel. para o acórdão min. Ricardo Lewandowski, julgado em 04.11.2008). Ordem parcialmente conhecida e, nesta parte, denegada.
HC 93353 / SP .EMENTA: ROUBO QUALIFICADO PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APREENSÃO E PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DE SEU POTENCIAL OFENSIVO. DESNECESSIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. ORDEM DENEGADA. I. Não se mostra necessária a apreensão e perícia da arma de fogo empregada no roubo para comprovar o seu potencial lesivo, visto que tal qualidade integra a própria natureza do artefato. II. Lesividade do instrumento que se encontra in re ipsa. III. A qualificadora do art. 157, § 2º, I, do Código Penal, pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima - reduzida à impossibilidade de resistência pelo agente - ou pelo depoimento de testemunha presencial. IV. Se o acusado alegar o contrário ou sustentar a ausência de potencial lesivo da arma empregada para intimidar a vítima, será dele o ônus de produzir tal prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. V. A arma de fogo, mesmo que não tenha o poder de disparar projéteis, pode ser empregada como instrumento contundente, apto a produzir lesões graves. VI. Hipótese que não guarda correspondência com o roubo praticado com arma de brinquedo. VII. Precedente do STF. VIII. Ordem indeferida.
Fernando Capez (CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal, volume 2 : parte especial : dos crimes contra a pessoa,dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos mortos. arts. 121 a 212 - 7. ed. rev. e atual. - São Paulo : Saraiva, 2007), manifesta-se no seguinte sentido: "Para a caracterização do crime de roubo simples basta tão-somente o relato da vítima ou a prova testemunhal no sentido de que o agente portava arma de fogo , pouco importando a sua eficácia, pois exige-se apenas a prova da grave ameaça. Dúvidas surgem quanto à caracterização da agravante do emprego de arma. Para aqueles que entendem que o roubo será agravado, ainda que a arma não tenha potencialidade lesiva (arma de brinquedo, defeituosa ou desmuniciada), prescinde-se da apreensão da arma de fogo e posterior confecção de laudo pericial para constatação da eficácia do meio empregado, pois não importa para a incidência da causa de aumento de pena se o meio empregado tem ou não poder vulnerante. Desta feita, basta o relato da vítima ou a prova testemunhal para que a majorante incida. Por outro lado, para aqueles que entendem que a majorante somente incidirá se o meio empregado tiver potencialidade ofensiva, é preciso realizar a apreensão da arma de fogo e posterior confecção de laudo pericial, pois ausente o poder vulnerante da mesma, afasta-se a causa de aumento de pena . Tal será prescindível se do relato da vitima ou da prova testemunhal for possível concluir que a arma é eficaz, por exemplo, afirmar que o agente efetuou disparos; ou a constatação da presença de buracos de bala na parede da residência ou de cápsulas deflagradas no chão do local do crime".
Sobre o crime de roubo:
O crime de roubo é tido pela doutrina como crime complexo, ou seja, é a reunião dos delitos de furto mais constrangimento ilegal. Tutela a um só tempo o patrimônio e a liberdade individual da vítima. Pode ser praticado por qualquer pessoa, menos pelo dono do objeto, pois este estaria cometendo, conforme o caso, exercício arbitrário das próprias razões. O Código Penal fez a distinção, embora não usando esta nomenclatura, de duas espécies de roubo, o próprio e o impróprio.
Roubo Próprio: CP, art. 157, caput - "Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido a impossibilidade de resistência".
Roubo Impróprio: CP, art. 157, §1º - "Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência contra a pessoa ou grave ameaça, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro".
O parágrafo 2º traz as majorantes ou causas de aumento de pena aplicáveis tanto ao roubo próprio quanto do impróprio.
CP, art. 157, §2º - "A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
I - se a violência ou ameaça é exercida com o emprego de arma;
II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;
III - se a vítima está em serviço de transporte de valores e o agente conhece tal circunstância;
IV - se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior;
V - se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade".
Das muitas polêmicas que envolvem este artigo, se discute muito sobre o inciso I, se é necessário o efetivo emprego da arma ou se basta portar. Para Cezar Roberto Bitencourt, "Segundo a dicção do texto legal, é necessário o emprego efetivo da arma, sendo insuficiente o simples portar"; já para Luiz Regis Prado, "é suficiente para a caracterização da majorante que o sujeito ativo porte arma ostensivamente, de modo que ameace a vítima, vale dizer, não é imprescindível que venha a fazer uso do instrumento para praticar a violência ou grave ameaça, sob pena de esvaziamento da ratio legis".
Rogério Grego segue o mesmo raciocínio de 'Bitencourt' e entende que a arma deve ser efetivamente utilizada no momento da prática delituosa e exemplifica, "tanto emprega a arma o agente que, sem retirá-la da cintura, mas com a mão sobre ela, anuncia o roubo, intimidando a vítima, como aquele que, após sacá-la, a aponta em direção a sua cabeça. O importante é que ela seja usada durante o roubo, mesmo que a ameaça seja levada a efeito implicitamente".
Vamos aguardar que seja sábia a decisão do Supremo!
Fonte: Informativo 534