Direitos e Deveres
Salários de servidores públicos na internet, já!
Autor(es): Gil Castelo Branco |
O Globo - 20/07/2010 |
Você gostaria de ver os nomes e os salários dos servidores públicos divulgados em um site governamental na internet? E você, funcionário público, ficaria constrangido com essa exposição?
O governo do Paraná, por exemplo, divulga, desde fevereiro, a lista com o nome, cargo e salário dos quase 162 mil funcionários públicos ativos. Informa ainda quem ocupa cargos em comissão, de direção, assessoramento e gerência nos órgãos das administrações direta e indireta do governo estadual.
Experiência semelhante acontece na capital paulista, onde, desde junho do ano passado, a prefeitura divulga o nome e a remuneração bruta de aproximadamente 150 mil funcionários, para desespero de alguns sindicatos. A iniciativa foi parar na Justiça, que a princípio tirou o site do ar, mas no dia seguinte restabeleceu o portal.
No mês seguinte à polêmica em São Paulo, o caso chegou ao Supremo Tribunal Federal, onde o ministro Gilmar Mendes liberou a divulgação dos salários.
Ele considerou que a medida obedecia ao princípio constitucional da publicidade dos atos públicos, afirmando também que "a legislação municipal abriu margem para a concretização da política de gestão transparente da administração pública, possibilitando maior eficiência e ampliação do controle social e oficial dos gastos municipais".
Não é novidade. Muitos países já colocam os salários dos servidores à mostra. É o caso de Chile, Peru, México, Paraguai e Estados Unidos, onde a prática ocorre desde 1995. Nestes países, a medida não é considerada invasão de privacidade, tampouco instrumento de constrangimento.
Qualquer cidadão americano, por exemplo, pode saber quanto ganham os servidores da Casa Branca, os membros do Congresso Nacional e até os magistrados.
Pela internet, é possível saber que o presidente Barack Obama recebe R$711,2 mil (US$400 mil) por ano, ou cerca de R$59,3 mil mensais. Já o vice-presidente Joe Biden tem um salário menor - R$33,6 mil mensais ou R$403,6 mil ao ano.
A tese é que a divulgação não invade a privacidade do indivíduo, o que só ocorreria se fosse exposto o que o servidor faz com os seus rendimentos. Além disso, nas empresas privadas os patrões conhecem os salários dos funcionários e, no caso dos servidores públicos, os patrões somos todos nós.
Se a sociedade paga a conta, precisa saber quanto está pagando e a quem.
Sou a favor da exposição dos salários. Diante de tantos e tantos escândalos federais, estaduais e municipais envolvendo gastos com pessoal, a divulgação dos salários poderá ser um antídoto. Tomando-se como exemplo a crise no Senado, ocorrida no primeiro semestre de 2009, caso os nomes e salários dos servidores fossem há anos divulgados, provavelmente o nepotismo seria menor. Também já teríamos discutido sobre os supersalários e as horas extras pagas nas férias, visto que todas as remunerações estariam na internet.
Desta forma, sob a perspectiva do interesse público, os benefícios advindos do controle social podem se sobrepor ao eventual constrangimento de um ou outro funcionário, no que diz respeito à sua privacidade.
A verdade é que chegamos tarde à festa da democracia, mas entramos no baile. A transparência - principal inimiga da corrupção - avança no Brasil de forma suprapartidária, tal como deve ser. Os políticos parecem estar descobrindo que a transparência, além de ser um direito do cidadão, dá votos. Mas ainda há muito a conquistar.
Recentemente, o Executivo federal, estados e municípios (acima de 100 mil habitantes) foram obrigados a divulgar suas contas na internet, sob pena de suspensão das transferências voluntárias da União. Além disso, já foi aprovado na Câmara dos Deputados projeto encaminhado pelo Executivo que cria mecanismos claros para garantir ao cidadão o acesso às informações públicas, nos moldes do que já ocorre em mais de 70 países.
Assim, o Brasil adequa-se à Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção - da qual é signatário -, que possui um capítulo inteiro destinado à participação da sociedade.
É óbvio que o cidadão só participará intensamente da vida nacional se houver transparência, gostem ou não os funcionários públicos.
A transparência chegou. O que precisamos, agora, é vencer preconceitos quanto aos limites.
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