O serviço público reprovado
Direitos e Deveres

O serviço público reprovado


O Estado de S. Paulo - 05/08/2009

Qualidade do serviço público não é um dos assuntos preferidos nos altos escalões da República, em Brasília. Ao contrário: não é de bom-tom iniciar discussões sobre temas como competência e produtividade, quando se fala sobre o número de funcionários e sobre o tamanho da folha salarial do governo. Só por isso merece aplausos o presidente do TCU, Ubiratan Aguiar, por ter provocado um debate sobre o treinamento do pessoal. Ele propôs a criação de uma escola para ensinar noções de gestão ao funcionalismo e o resultado imediato foi uma polêmica.

A ideia foi rejeitada pela diretora de Comunicação e Pesquisa da Escola Nacional de Administração Pública, Paula Montagner. Não é necessário, segundo ela, criar mais uma estrutura para treinar o pessoal. Mas o presidente do TCU tem motivos muito ponderáveis para defender uma formação melhor para os administradores federais. O tribunal tem apontado falhas importantes em projetos do Executivo - às vezes provocadas por dolo, às vezes por deficiência técnica, segundo Ubiratan Aguiar. No Palácio do Planalto, a atuação do TCU tem sido criticada, ultimamente, como um obstáculo à realização do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Mas ninguém tem contestado, com argumentos sérios, a qualidade técnica das avaliações apresentadas pelo TCU.

O fato politicamente mais importante, neste momento, não é o próprio debate sobre a criação de mais uma escola de administração vinculada ao governo federal. O autor da proposta, encaminhada há três semanas à ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, justifica sua ideia com uma opinião severa sobre a formação gerencial dos funcionários públicos. Não é uma crítica solitária. Segundo o jornal Valor, o secretário de Gestão do
Ministério do Planejamento, Marcelo Viana, também se declara insatisfeito. Segundo ele, as escolas de governo cuidam muito dos aspectos teóricos e científicos da administração, mas não dão atenção suficiente aos problemas efetivos, práticos, da gestão pública. Se essas escolas têm de fato um ensino de elevado padrão teórico, é algo para se conferir. Mas sobre as deficiências do funcionalismo não pode haver muita dúvida.

Segundo Viana, há pouca ou nenhuma pressão no serviço público pela produção de resultados. O Banco do Brasil e a Petrobrás têm de proporcionar resultados aos acionistas, mas a maior parte da administração pública funciona em condições muito diferentes. O governo, disse o secretário, aumentou os salários do funcionalismo e reajustou diversos planos de carreira nos últimos anos. Além disso, foram abertos concursos para a contratação de pessoal em diversas áreas. Os dois problemas apontados com frequência - salários baixos e falta de pessoal - foram enfrentados. "Se fizemos tudo isso, por que o serviço público não é bom?" pergunta o secretário. Ele mesmo responde. Em primeiro lugar, a capacitação não é tratada como necessidade estratégica, mas como prêmio para os bons
servidores. Capacita-se o mais capacitado. Em segundo lugar, as funções de controle são favorecidas, enquanto se dá pouca importância (traduzida em salários baixos e treinamento escasso) às funções de execução.

Essas explicações podem esclarecer parte do problema. No entanto, é preciso levar em conta um fator aparentemente esquecido pelo secretário: os aumentos de salários e as contratações dos últimos anos não se destinaram prioritariamente a elevar a qualidade e a produtividade do serviço público. Foram acima de tudo medidas político-eleitorais.

O secretário Marcelo Viana mostrou-se notavelmente sincero ao reconhecer o descompasso entre as medidas a favor do funcionalismo - aumentos salariais e contratações - e a evolução da qualidade dos serviços. Só faltou incluir em sua lista de explicações a mais prosaica e a mais importante: boa administração não é prioridade do governo petista. Prioridade é usar a máquina estatal como instrumento de ação partidária. Isso explica o emperramento do PAC e explicará, nos próximos anos, a deterioração do quadro fiscal causada pelo inchaço da folha de pessoal e de gastos de custeio. Pelo menos nisso o governo é transparente.





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